A residência de Cristian Duarte (SP) trouxe para o jogo uma das questões mais difíceis no que diz respeito à criação, a proposição de uma metodologia de pesquisa. Uma que seja clara (a palavra de ordem da residência foi, definitivamente, “clareza”) e, dessa forma, realmente possibilite a instauração do novo, do improvável, embora não gratuito, por não perder de vista o objetivo principal.

É verdade que esse objetivo pode até ser alterado, requestionado durante o processo, o que não significa que o perdemos de vista. Acredito até que uma metodologia de pesquisa eficiente naturalmente leva a isso. Mas o que importa é que, embora transformado, o objetivo esteja claro a cada fase, a cada dia da pesquisa.

Gostei muito de observar como e a partir de que estímulos construimos juntos as estratégias, os exercícios – e, mais ainda, de como sabemos a trajetória de cada proposta. Isso faz com que se ganhe cada vez mais propriedade de discurso. Questões como “Que perguntas eu faço a mim mesmo?” e “Que perguntas são eficientes para gerar um maior entendimento de minha proposta?” já sinalizam vários caminhos, possíveis pontos de partida.

Afinal de contas, como Duarte nos lembrou, são as boas perguntas que geram boas idéias.

(...)

Sobre a entrevista trocada: consiste em uma entrevista onde eu cedo meu projeto a um colega e o entrevisto como se ele fosse o propositor do projeto.

O barato aqui é:

1) Para o propositor real do projeto podem surgir soluções, caminhos que instiguem novos desdobramentos de questões presentes na sua idéia. Cabe a ele formular perguntas (para a entrevista) que carreguem tal potencial de abertura de possibilidades para o que ele mesmo busca através de seu projeto;

2) Para o entrevistado fake, ler e entrar em contato com um projeto que pode ser tão distante de seu objeto de pesquisa deve ser igualmente revelador e instigante.

Como as entrevistas trocadas aconteceram em corrente (ou seja, quem numa dada dupla foi entrevistado, foi o entrevistador numa outra), todo mundo teve a oportunidade de vivenciar os dois ângulos do exercício. Após a entrevista, entrevistado e entrevistador tiveram a tarefa de encontrar uma metáfora que condensasse a experiência dos dois. Inclusive, Duarte nos enviou alguns links para pensar sobre os possíveis significados da palavra “metáfora”.

Como estágio final do exercício, entraria em cena a figura do crítico/refletor (o que acabou não acontecendo por termos optado por outras bifurcações durante a residência). Este debateria a metáfora (construída por ambos entrevistador e entrevistado) a partir de seus próprios referenciais.

Anteriormente, já havíamos feito uma apresentação (gravada em vídeo) de projetos trocados (que chamamos de depoimento). A tarefa (task) era se apropriar dos projetos como se fossem nossos. Esta fase de entrevistas foi um desdobramento do depoimento.

(...)

Algumas pistas/conclusões (?) sobre tarefas (tasks):

1. a restrição pode servir como estratégia de esclarecimento da task (clareza);

2. a diferença entre task e score (que compreendi sob uma dialética dedutiva/indutiva);

3. em certa medida, a task é a própria obra, pois que esta acaba sendo o reflexo de uma ou mais tasks;

4. tasks podem ser fantásticas por si mesmas, mas nem sempre geram ou dão um salto na direção de um caminho para a composição coreográfica;

5. via de regra, há a necessidade de se adicionar ou alterar aspectos de uma dada task para que ela produza material com potencial de transformação (4);

6. revelar a task em si também pode fazer parte da composição;

7. o uso ou contato com outras mídias/linguagens, como Duarte fez com os videoartistas Aernout Mik e Martin Arnold, pode constituir/ser ponto de partida para uma task;

8. a task pode resvalar numa direção de cena, o que impede o surgimento de possibilidades que não foram previamente avaliadas e cogitadas;

9. o objetivo de uma task não é necessariamente "acertar", "completar" a tarefa em si, mas sim gerar novos desdobramentos, questões e, por que não, respostas.

(...)

Terminamos a residência com Duarte através de uma sessão aberta a alguns convidados onde experimentamos uma ferramenta nova.

Era a Générique Tool, sugerida no site everybodystoolbox.net. O site oferece um apanhado de ferramentas e estratégias de investigação para a criação artística em dança.

A Générique (a palavra francesa significa tanto “genérico” como os créditos finais de um filme) Tool, que experimentamos pela primeira vez juntamente com os convidados, consiste na instauração de uma situação pós-apresentação. Ou seja, parte-se do pressuposto de que uma performance acabou de ser apresentada. Daí, dentre os presentes, escolhem-se pessoas para compor o grupo de supostos performers, além de outras que formarão a platéia.

O que se segue é um bate-papo entre “platéia” e “performers” (a partir de 3, de acordo com as instruções do site) sobre a performance (como se ela tivesse acontecido de verdade). Assim, a dita performance é criada, imaginada a partir da própria conversa.

A ferramenta funcionou bem, e embora os convidados não tenham querido se aventurar no grupo de performers, o diálogo rendeu situações bem interessantes. Por outro lado, talvez tenhamos investido demais no caráter ficcional da coisa, curtindo o lado improvável e o nonsense da situação mais do que, necessariamente, extraído pistas mais concretas e válidas para nossos próprios desejos de criação.

Micheline Torres, uma das convidadas, também frisou a importância de se ater às restrições e indicações da ferramenta com rigor. Assim fica mais fácil identificar o que pode apontar novos desdobramentos, além de evitar a armadilha do encantamento e mero divertimento com a ferramenta em si.

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Comentario por Eduardo Bonito el | em mayo 29, 2009 a las | às 1:29am
Oi andre,

muito legal o post - bom para quem como eu quer acompamhar o projeto

bjs

edu
Comentario por Luisa Coser Seraphim el | em mayo 13, 2009 a las | às 9:54am
nossa quanta coisa....

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